A
neurocientista inglesa Susan Greenfield uma das mais renomadas da Inglaterra
não cala sua voz diante á empolgação de muita gente com o potencial dos
aparelhos de ultima tecnologia, redes sociais e internet.
Para
ela, há razões para acreditar que a vida virtual torna as pessoas menos
inteligentes e menos capazes de desenvolver um aprendizado que busca o objetivo
gradativamente.
As
crianças em especial precisam, sim, ter acesso ás possibilidades oferecidas
pela tecnologia, mas de uma forma organizada e orientada para que possa levar a
um efetivo aprendizado. O uso excessivo de videogame, laptop ou internet
atrapalha o aprendizado da criança.
TRECHOS
DA ENTREVISTA
Veja - Qual é o
paralelo entre a doença de Alzheimer e os efeitos sobre o cérebro do uso
exagerado de aparelhos conectados à internet?
Susan Greenfield - Fui mal interpretada em uma
entrevista e passaram a me atribuir algo que eu não disse. O Alzheimer, à
medida que avança, provoca a perda de células cerebrais, conduzindo o paciente
a um estado de alienação crescente. Não afirmei que a tecnologia provoca a
morte dos neurônios. Não há prova científica disso. O que realmente disse e
reafirmo é que computadores, tablets, smarrphones, enfim, todos os
dispositivos interativos, quando usados excessiva e ininterruptamente, deixam
a mente em um estado de confusão sobre o aqui e o agora muito semelhante aos
efeitos do Alzheimer. A pessoas nesse estado perdem momentaneamente a noção
clara do que seja passado, presente ou futuro. Alguém imerso nesse universo virtual
está sempre de prontidão para responder rapidamente a um e-mail ou uma
mensagem de bate-papo. Essa disponibilidade instantânea para os apelos
digitais interativos, dominada pelos sentidos e não pela cognição, deixa a
mente em um estado semelhante ao provocado pelo Alzheimer ou mesmo pelo
autismo. Ainda não existem evidências de que o cérebro sadio submetido de
maneira intermitente a esse estímulos sofrerá transformações fisiológicas
permanentes. No entanto, essa é uma hipótese a considerar seriamente a longo
prazo.
Veja - A noção predominante entre os estudiosos, porém,
é que os estímulos digitais estão aumentando a eficiência do cérebro humano.
Essa noção é equivocada?
Susan Greenfield - Obviamente, qualquer atividade
contribui para o desenvolvimento cerebral. Estudos feitos nas últimas décadas
comprovaram a capacidade de o cérebro reorganizar-se e reinventar-se a todo o
momento por meio de estímulos externos. É a neuroplasticidade. Os videogames
desenvolvem a coordenação motora e a memória. Isso está comprovado. Nos
adultos, sobretudo nos idosos, a interatividade mostrou-se uma excelente
ferramenta para estimular a neogênese, a formação de novas células cerebrais,
e até promover certo bem-estar mental. Há relatos científicos de diminuição dos
sintomas da depressão em virtude de relacionamentos que o paciente retomou ou
criou nas redes sociais. Minha mãe é Viúva, tem 85 anos e mora sozinha. Meu
irmão e eu gostaríamos muito que ela tivesse uma conta no Face book. Mas,
infelizmente, ela se recusa. Meu ponto, então, não é a condenação da era da informação.
O que eu reafirmo é que a exemplo de um carro, que nos serve tanto, mas com o
qual podemos atropelar e matar alguém, obter o benefícios e evitar os males
das nova tecnologias depende apenas do usuário.
Veja - A comunidade científica levou a sério seu alerta
sobre o perigo de os videogames, na infância, estarem produzindo adultos
"sem ética e atrofiados emocionalmente"?
Susan Greenfield - Essa é uma constatação irrefutável.
Pense na fábula da princesa presa na torre. Existe uma enorme diferença entre a
experiência de ler sobre Rapunzel em um livro e a de participar de um game
em que o objetivo é resgatá-la. O livro apresenta à criança a narração plena da
história da princesa. A vida dela faz parte de um contexto. Já no game a
princesa é apenas um objetivo, não importa nem como ela chegou a ser
aprisionada na torre, não se constrói em nenhum momento um vinculo emocional
com a personagem, tampouco se discutem as questões éticas de aprisionar alguém
ou as virtudes de caráter ou de coração do ato de salvá-la. A única coisa que
importa é ganhar o jogo. Parece-me evidente que são duas vias bem distintas.
Veja - O convívio nas redes sociais aceita uma
latitude maior na conduta ética das pessoas?
Susan Greenfield - Sem dúvida. O mundo virtual,
as pessoas podem se comportar de um modo como jamais fariam no mundo real.
Elas perdem seus constrangimentos naturais, o que normalmente barra os maus
comportamentos, a rede, muita gente se expõe como jamais faria nem mesmo no
ambiente familiar ou na frente dos amigos mais íntimos. Essa liberalidade
começou com os e-mails, mas atingiu o ápice com o Face book. Os limites
do certo e do errado estão cada vez mais difíceis de ser definidos. O livro O
Senhor das Moscas, obra-prima de William Golding, conta a história de um
naufrágio de estudantes. Presos em uma ilha e submetidos a enormes privações,
eles perdem o verniz civilizatório e se tomam selvagens. Por alguma razão,
estar nas redes sociais pode produzir o mesmo efeito de desconsideração com os
outros que acometeu os estudantes do livro de Golding presos na ilha.
Veja - Antes eram as revistas em quadrinhos, depois a
televisão, agora a internet e os games. Será que cada era tem seu
falso inimigo do cérebro das crianças?
Susan Greenfield - Existe uma diferença crucial. As
novas tecnologias são muito mais invasivas e têm um impacto infinitamente maior
até mesmo que o da televisão. As pessoas agora estão sendo levadas a ter uma
percepção da vida como uma sucessão de pequenas tarefas desconectada entre si,
exatamente como no game da Rapunzel. O ser humano é produto de
histórias, da preservação de
memórias, enfim,
da narrativa, não há mais narrativa. Tudo não passa de ação e reação.
Veja - Mas a senhora não acha que tem sido gigantesca a
contribuição das tecnologias interativas para a educação?
Susan Greenfield - Uma pesquisa divulgada no ano
passado, na Inglaterra, derruba essa tese. Três quartos dos professores
ingleses reclamam da crescente dificuldade de concentração dos alunos. Quase todos os pais entrevistados
afirmaram que os filhos gastam o triplo do tempo na frente de uma tela em
comparação com o que dedicam a um livro, não concordo com os especialistas que
sugerem distribuir tablets aos alunos. Isso não resolve. A única maneira
de prender a atenção das crianças nos dias de hoje é ter professores
inspiradores. A tecnologia é fundamental e excitante, mas, sozinha, não
identifica nem desenvolve talentos.
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